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Mostrando postagens de 2015

Rola alheia - Igor Dias

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Rola alheia                                                  (A cena é protagonizada por Cadu e Celina, durante um café da manhã. Ao longo da cena, Celina passa de um estado tranquilo ao de uma preocupação verdadeira, com rompantes histéricos. Cadu sustenta durante a cena inteira uma postura dúbia, confundindo o espectador entre a seriedade e o sarcasmo. O diálogo, que deverá ser lido por duas pessoas, começa pela fala de Cadu) - Celina, não vai tomar café hoje? - Já vou, amor. - Olha, eu pensei muito por esses dias no que você me disse. Acho que podemos negociar a rola alheia. - Sério, Cadu? - Sério. Tenho tentado me convencer de que a monogamia é só mais uma coisa culturalmente imposta pela sociedade opressora e blablablá. - Nossa, Cadu. Obrigado, não sei nem o que dizer. Acho que eu não esperava por isso. - Você agora tem a liberdade de procurar na rua a rola que você quiser. Pode escolher: rola grossa, rola fina, rola veiuda. Agora você é livre pra ter o se

Mote do encontro (28/ 11/ 15)

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Mote lido por Walter Macedo Filho   Carta de Graciliano Ramos para a irmã Marili Rio, 23 de novembro de 1949. Marili: mando-lhe alguns números do jornal que publicou o seu conto. Retardei a publicação: andei muito ocupado estive alguns dias de cama, a cabeça rebentada, sem poder ler. Quando me levantei, pedi a Ricardo que datilografasse a Mariana e dei-a ao Álvaro Lins. Não quis metê-la numa revista: essas revistinhas vagabundas inutilizam um principiante. Mariana saiu num suplemento que a recomenda. Veja a companhia. Há uns cretinos, mas há sujeitos importantes. Adiante. Aqui em casa gostaram muito do conto, foram excessivos. Não vou tão longe. Achei-o apresentável, mas, em vez de elogiá-lo, acho melhor exibir os defeitos dele. Julgo que você entrou num mau caminho. Expôs uma criatura simples, que lava roupa e faz renda, com as complicações interiores de menina habituada aos romances e ao colégio. As caboclas da nossa terra são meio selvagens, quase inteiramente selv

Terça em dobro - Poliana Paiva

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Terça em dobro Ele era aquele tipo que dá um suadouro só de olhar. Um sorriso, umas   mãos enormes, uma pegada rústica. Não sei se o bofe era tão magia assim ou se o encantamento tinha a ver com o último dia de carnaval. Só sei que tudo nele exalava   luxúria e purpurina. Se desse mole, ele tinha purpurina até no cu. Eu não me importava com nada. Ele era todo dourado, todo suado, todo enamorado de minha pessoa. Volta e meia, entre uma pirocada e outra, lembrava de uma amiga que sempre me falou pra passar carnaval na Bahia, mas eu não perdia por esperar. Não tinha noção do que vinha pela frente. Ou melhor, do que vinha por trás. Fui precisa, escolhi um cara que era praticamente um profissional da alegria: aquela boca, quando não estava me beijando, só sorria. Um sorriso com tantos dentes que me fazia pensar apenas em mordidas. Eu estava que era pura libido. Meu lindo lago do amor já tinha virado bacia hidrográfica de tanto que eu estava animada. Uma hora, não sei se por efe

A Cereja do Bolo - Gustavo de Souza

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A Cereja do Bolo - “Damião não tem no cú o que a periquita roa, minha filha” – ela disse, quando Nana de preparava para sair. – “Você arrumava coisa melhor”. - “Você não sabe de nada, madrinha.” - respondeu Nana, mandando um beijo e fechando a porta. É verdade que Damião não tinha onde cair morto, nem ambição que pudesse modificar a sua situação no mundo. Só que Nana era mulher de um outro tempo. Jamais aceitaria ser sustentada por homem nenhum. Apesar de jovem, ela ganhava bem e parecia que iria atravessar a crise sem muitos sobressaltos. Fizera as escolhas certas. Gostava de dormir na casa de Damião, que na verdade era uma parte de casa em Santa Tereza. Aquele contraste da vida lenta do alto com o mundo corporativo lá embaixo onde ela passava seus dias, lhe fazia muito bem. Além disso, Damião era uma caixinha de surpresas. Quem o visse nas roupas alternativas que ele usava não conseguia imaginar o corpo que elas escondiam. Magrinho de dar dó, ele era na verdade um fals